terça-feira, 23 de abril de 2013

PASSADO


 
Repentinamente um dia perdido do passado
Coberto por teias e um tanto de pó
Reapareceu-me diante dos olhos perplexos
Caído entre minhas mãos ágeis e trabalhadoras
Que tudo se dispunham a organizar.

Impressas numa folha de papel amarelada
Antigas palavras e rasuras de próprio punho
Riscadas em ponta de caneta azul tinteiro
Expuseram mágoas e tristezas do coração
Derramadas em letras por chorosos poros.

O amor por algumas horas correspondido
Não correspondeu na sucessão de horas a fio
O amado entediado com a calmaria do romance
Respingou olhares de sedução a novas aventuras
Abandonando ao léu um coração apaixonado:

“...E como tolos
Perdemos todos
Sobrou nada de mim
Nada para ti
Nada para os lados de lá.
Ficamos a vagar no vazio:
Sem imagem, sem palavras
Sem o amor nem um amado.
Não restou nem um frasco de perfume...”

domingo, 14 de abril de 2013

OLHAR

Foto por Rosa Helena

Olhar que tudo vê
Nada explica
Porque não sabe explicar,
Nem quer
Apenas procura.



Olhar que sente o que vê
Exulta-se,
Porque simplesmente
Deixa-se às vibrações
Do experimentar.



Olhar que para
Que corre e mergulha
Olhar que se fecha
A abrir-se ao novo
Olhar. Que plaina e aterrissa



Na magia ilógica do agora
Olhar que descomplica o que vê
Porque só olha e vê. E sente
Feito criança,
Quer olhar e brincar.



As crianças que sobrevivem em mim
Querem olhar meus mundos e remexê-los,
Divertirem-se com minhas incoerências
Rirem-se da minha sobriedade e caretice.
Elas querem olhar e ver - não querem entender.




Adoro ver a vida com os olhos das crianças
Escondidos atrás do meu enxergar.
Crianças que me habitam e me nutrem
Danadinhas que toda hora me escapam
E se revelam pulando soltas através do meu olhar.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

RETRATO REFEITO


Roupas desdobradas jogadas amassadas
Sobre cama e chão, poltrona ou balcão
Janelas cerradas. Porta entreaberta
Um quarto, uma bagunça. Lágrimas?

Olhos congestionados, lábios apagados
Passos arrastados por pés machucados
Sangue escorrido da alma - gotículas calmas
Vermelho pensar, vermelho corpo, vermelho

Panelas vazias, bolso vazio, palavras vazias
Pó sobre armários e abandonados retratos

Fotografias frias de alegrias esquecidas
Chuvisqueiro borrando apagando esgotando

Urge sair do torpor e tudo arrumar, lavar a cara
Pintar azul sobre o vermelho, aliviar o cenho
Cobrir ferida, desamassar-me no desenho
Rechear carteira, romper fronteira, encher a cara?
 
Roupas dobradas sobre a cama, janelas entreabertas
Um quarto vermelho e azul. Olhos, palavras, alegrias
Fotografias antigas descoloridas. Esquecidas?
Desenho pintado, retrato refeito. Nova cara. Meu jeito.


segunda-feira, 1 de abril de 2013

MAIS UMA VEZ: NADA

 
As soberanas palavras foram duras
Trincaram-lhe cara e armadura
Depois se caiu em estilhaços
Cacos com faces de palhaço
Estereótipos do estereotipado
Desmascarado um novo culpado,
E o que aconteceu? Trágicamente - nada.