Véspera de Natal. Cheguei
a Capão da Canoa antes da maioria dos veranistas, pessoas que vindas de todo o
estado deverão lotar as praias do litoral gaúcho a partir deste final de
semana. Ontem o dia foi de muitas chuvas, porém hoje amanheceu ensolarado e com
gostosa brisa na beira do mar.
Logo após o desjejum
matinal fui a uma caminhada na areia, ainda encharcada e quase despovoada. Com
passo firme, mas sem pressa, fui para a direção do centro da cidade, namorando
o mar e curtindo o refrescante ar marinho. Algumas poucas famílias brincavam
com bolas ou na água, e vi criança fazer castelo na areia; tudo em plena harmonia
com a ordem natural das coisas.
Chegando a altura do
centro dei a volta e caminhei passando da minha saída. Já havia ficado na praia além do tempo proposto. Mas, a paisagem estava mais do que convidativa e, por isso, me estendi
no percurso. Quando decidi retornar ao “apertamento” da família, ainda parei em
uma guarita de salva-vidas, pois queria sondar sobre a possibilidade de suporte a
uma possível aventura que pretendo fazer - a nado. É, estou sempre sonhando!
Assim, tranquilamente
satisfeita, deixei a beira do mar por uma trilha em meio ao resíduo de antigas dunas. Sobre um dos morrinhos de areia avistei uma
ave de médio porte, provavelmente um quero-quero. Embevecida com a magia do cenário,
prossegui a passos pequenos para melhor admirar a natureza contagiante.
O pássaro gritou e se
pôs a voar. Lindo! O quero-quero, em voo rápido, veio na minha direção. Belo! Chegou tão perto, tão perto em um voo rasante, que quase
me atropelou. Opa, o que foi isso? Foi uma ameaça?
Em seguida, uma
segunda ave, graúda e pouco amistosa como a anterior, que eu não tinha
avistado e estava sobre outro montinho de areia, veio gritando e rápida na
minha direção. Assustadora! A terceira veio pela frente, sei lá de onde surgiu,
e se atirou agressivamente sobre mim, gritando forte e intensamente. Apavorante!!!
Atordoada com a
mudança repentina do espetáculo da natureza, reagi instintivamente sacudindo
os braços com a canga nas mãos. Soltei um berro e cai estatelada sobre o chão de
areia mais seca, coberto por gramíneas espinhosas. Tão ligeira quanto pude - sem
bicadas, mas bem fincada pelas pequenas rosetas secas - levantei e saí correndo
de volta à praia. Inesperadamente, vejam só, eu fui atacada por três
quero-queros endoidecidos e, absolutamente, nada românticos.
Já afastada da
hostilidade imprevista, e ainda com medo, percebi que estava sendo observada
por um homem. Constrangida, e sem saber o tamanho do meu fiasco, fui à direção
dele fazendo comentários dispersos e desconexos. O indivíduo também não se fazia
compreensivo e, de forma confusa, dizia para eu pegar um pau e atacar os
pássaros.
Naquele momento nada
fazia sentido: ali não havia pau, só areia; eu não queria atacar os quero-queros,
só queria admirá-los; estas aves não são perigosas, nem eu tão pouco.
O ocorrido foi
intenso e breve, perigoso e óbvio. Os pássaros protegiam um ou dois ninhos e sentiram-se
ameaçados com a minha presença. O homem pretendia usar o mesmo caminho e também
se assustou assistindo o ataque sobre mim.
O desfecho do
episódio foi o seguinte: saí da praia por outro caminho; os pássaros foram deixados
em paz; eu fiz um novo amigo-conhecido; e mais uma vez, acolhi com admiração a
grandeza da natureza. E, depois do susto, sempre ficou uma nova história para
contar.
Enfim, como não
suspirar pela vida? Ela é surpreendentemente maravilhosa e emocionante, mesmo diante das pequenas aventuras inesperadas de um dia após o outro!