Minha amiga Mariana era uma mulher moderna. Conhecia muitos homens, fez um filho independente e trabalhava para se manter. Com o curso superior completo e totalmente dona do seu nariz, Mariana abominava a ideia de qualquer tipo de casamento, mesmo os mais atualizados e flexíveis. Dizia sempre que isso não condizia com a imagem de mulher moderna. Embora fosse avessa a casamentos, adorava namorar, ter alguns romances, ficar com alguém por tempo determinado. Sabia de sexo como ninguém, dava conselhos, dicas e sugeria estratégias eficientíssimas para aumentar o tempo e a intensidade dos orgasmos. Identificava os diferentes tipos de homens, além de ter, para cada um deles, fórmulas infalíveis de prendê-los ou de liberar-se destes algozes.
Coitada da minha amiga Mariana, tão sabida, foi surpreendida por uma traição do destino. Acabou caindo nas armadilhas da amizade. Apaixonou-se perdidamente pelo colega e amigo de trabalho que, para complicar, era casado. Apesar de seus esforços para não acreditar nisso, parecia estar totalmente apaixonada, e por tempo indeterminado.
Mariana já vinha sentindo alguns sintomas dessa conversão de amizade para algo estranho, mais sensível, mais ciumento, mais visceral, ou qualquer coisa que o equivalha. Mas, claro, não deu crédito a essa bobagem. Quanto mais o tempo passava, mais a amizade a perturbava. Arranjava mil pretextos para justificar a necessidade do trabalho a quatro mãos, mas só as mãos dela e as dele. E que ninguém se atrevesse a oferecer outras mãos para tais trabalhos, porque só os dois é que conseguiam àquela sintonia, àquela produtividade, àquela coisa toda. Já estava dando na vista, mas Mariana se negava ver o quanto ela estava derretida pelo tal amigo do trabalho.
Mariana começou a promover encontros de confraternização entre os colegas, logo após o expediente. A ideia era fortalecer o entrosamento da equipe. Mas os maridos ou esposas não deveriam participar, nunca, pois a presença deles poderia interferir na questão da “equipe de trabalho”.
Quando Mariana não estava trabalhando ou confraternizando com seus colegas, lá estava ela ouvindo seus vazios, suspirando emoções nunca antes experimentadas. Mariana sempre viveu acelerada, quer o assunto fosse moda, amores, trabalho, novidades gastronômicas, atividades físicas ou qualquer outra coisa. Era estranho vê-la perdida no seu mundo interno, parada no nada ou em devaneios românticos. Não parecia a Mariana que conhecia.
Um dia, cheguei em sua casa sem avisar e, ainda do lado de fora, ouvia sua voz falando sem parar. Falava de forma quase teatral. Minha surpresa foi maior quando entrei, pois ela tinha um roteiro na mão, escrito de próprio punho, com o qual ela ensaiava uma abordagem que faria ao amigo. Ao entrar, ela se abraçou forte em mim e se perdeu em lágrimas. Foi esta a primeira vez que confessou: não sabia mais o que fazer, estava perdidamente apaixonada. Estava ensaiando já fazia horas. Queria declarar-se, desejava que ele soubesse sobre seu amor, que ele a perdoasse pelo constrangimento e, acima de tudo, queria muito que ele a escolhesse. E isso era o mais difícil, ela sabia: ele era casado, mesmo que não muito bem casado, ele continuava sendo um homem casado.
Fiquei atônita. Como poderia ajudar a Mariana se a “expert” sempre fora ela? O que dizer? Como interferir no seu roteiro de amor? Eu não era tão moderna assim. Namorei, casei, tive filhos, essas coisas tão normais, coisas apenas de mulher. Como ajudar a Mariana? Só me restava sentar e ouvir. Conversamos um pouco, trocamos ideias caretas, pensamos sobre as perspectivas modernas que tínhamos ao nosso alcance, e lentamente Mariana ficava mais tranquila e determinada em seu objetivo. Com ou sem roteiro, ela investiria na sua felicidade. E seria amanhã.
Porém, passaram-se alguns dias até que a coragem de Mariana fosse experimentada. A declaração de amor da minha amiga deu um certo resultado, pois o casamento dele já vinha muito pior do que podíamos crer. Mas como tudo é processo, eles levaram algum tempo conversando e buscando ajeitar todas as situações. Depois da separação dele, bem depois, eles começaram a namorar. Um namoro, eu diria, quase antiquado, passo a passo. Noivaram com aliança e pequenas formalidades, casaram quando fazia mais de ano do início do namoro e, atualmente, estão esperando a primeira filhinha deles, visto que ela já tinha um filho apenas seu.
Ela continua apaixonada, feliz e um pouco menos moderna. Diria, até, que bem ajustada aos padrões convencionais. Uma mulher normal, com um casamento normal, e uma família normal. Mas uma felicidade sem tamanho.
Minha amiga Mariana era uma mulher que se dizia moderna. Hoje, Mariana diz-se apenas feliz, muito feliz. E eu, com tudo isso, aprendi que moderna ou não, tem que se ter determinação e criatividade, inclusive às questões do coração. Tendo amor, todo o resto é bobagem!