sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Em Porto Alegre


Roubaram o horizonte dos meus olhos. 

Houve um tempo, perdido no passado, em que eu abria a janela do quarto e via o aeroporto esparramado ao longe, os morros de Dois Irmãos mais ao fundo, e o (rio?) Guaíba espelhando o pôr do sol, completamente abastecido pelos rios (Jacuí, dos Sinos, Caí e Gravataí) que descem, e serpenteiam por entre municípios, até desaguarem no grande lago. 

Roubaram o horizonte dos meus olhos, ah, sim senhor. Roubaram.

Hoje abro as janelas do meu apartamento e me deparo com as cozinhas empoleiradas do prédio que se avizinha pelos fundos, e com quantidades de dormitórios (que procuro não atentar se decorados, arrumados ou de qualquer jeito) dos prédios situados aos lados direito e esquerdo do meu. E à frente, do outro lado da rua, me esforço por ignorar a movimentação das pessoas em suas elegantes salas. Hoje, a única paisagem que vejo ao abrir as janelas é a moradia dos meus vizinhos.

Roubaram o meu horizonte!


Com persistência procuro algum vestígio de horizonte entre vãos de construções. E com o esforço da vontade, consigo ver uma nesga de água do Guaíba e uma minúscula imagem de chaminé nos limites da visão, cuspindo fogo ou apenas fumaça a depender do dia, lá pelos lados de Charqueadas. Pequeno e singelo fragmento de horizonte, que não chega a ser um horizonte, mas apenas um mísero consolo à ilusão. Talvez um estímulo a instigar a saudade, para que ela complete com a imaginação o horizonte ausente aos olhos, mas eternamente guardado, intacto, no coração.