terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

Aventura

Final da tarde.
Sol de verão ainda alto no céu.
Uma praça em meio à cidade com alguns poucos passantes a cruzá-la, com pressa, sem nem ao menos enxergá-la.
E aquele imenso gramado verdejante me puxando e sugando ao seu abraço.
Eu estava ali parado, sentando em um banco no centro de tudo, ou seria a um canto de tudo? Enfim, eu estava ali sem saber por que ou porque não. Mas estava ali. Seduzido pelo verde, ah sim, eu estava; e esvaziado de pensamentos.
De repente uma brisa soprou suave e me atingiu como um furacão e, sem entender, me vi deitado sobre o gramado macio de olhos postos no céu, agora, completamente hipnotizado pelo azul anil salpicado de fiapos esbranquiçados e esgarçados de discretas nuvens a passeio.
O tempo parou, ou passou sem que eu o percebesse, não sei ao certo, essas coisas são tão parecidas. Fato é que eu vi diante da minha inércia, um pequeno ponto escuro a crescer e a tornar-se enorme buraco negro no céu. Medo e pavor foram os sentimentos primeiros. Tentei me levantar, ir embora, fugir, mas estava aderido e confundido ao gramado. Raízes me integravam ao solo? Um buraco crescendo a engolir tudo no alto do mundo. Sem fundo. Imensidão.
Sem encontrar recursos para ação - será que procurei bem? Relaxei. Acreditei que desta vez eu morreria. Ou? Pois não doía. Descobriria um grande segredo do universo ou da vida. Excitei-me a essa ideia, mas percebendo-me paralisado, tentei colocar-me oco de expectativas, afinal, entendi ser o mais sensato à ocasião. Será que eu estaria tendo um AVC? Por que um AVC? Porém o buraco negro avançava e cutucava minhas fantasias. Como seria ser engolido pela escuridão? Será que dela ressurgiria o azul a crescer e crescer em luz até apagar o escuro plenamente, num ciclo permanente de virar e desvirar-se do avesso? Um AVC? O que tem a ver “alhos com bugalhos”?
Sempre de olhos bem abertos na espreita do por vir, em dado instante percebi rostos a me olharem do alto e vozes diferentes a falarem comigo. “Senhor? O senhor está sentindo-se bem?” “Precisa de ajuda?” “Por favor, responda, o senhor caiu ou foi assaltado? Se machucou? Como se chama?” Olhei incrédulo àqueles seres inconvenientes a me roubarem do momento mágico no qual estava imerso, exatamente quando eu descobriria o ponto do recomeço ou o inexorável fim de tudo. “O senhor está bem?”
“Sim, sim, estou bem.” Recusando-me receber a ajuda que meus cabelos brancos pareciam pedir, sentei-me na grama desajeitadamente devagar, me pus de joelhos, e escorando em mim mesmo com as mãos fui me levantando até erguer-me totalmente. Para alegria daqueles estranhos seres estranhos, fiquei de pé a semelhança deles. “O senhor quer que façamos contato com algum familiar? Que alguém venha lhe buscar?” “O senhor sofre de algum mal?”
“Nenhum mal, nenhum mal, simplesmente estou amando. Sim, por favor, chamem a minha amada para me salvar. Ou não, não precisa, irei até ela agora. Vou contar a ela... foi tão interessante.” E caminhando em direção à rua, fui me afastando do pequeno grupo de pessoas preocupadas, que me seguiam com olhos desconfiados, a duvidarem da sanidade deste velho homem apaixonado. O amor faz a gente ficar bobo e louco. E feliz. E criativo e colorido e... Ah, como é bom. O amor, o amor.



Um comentário:

  1. Lindo texto!!!! O amor... É sempre o amor, não importa a idade. Feliz daquele que, em sua velhice, ainda tem o privilégio de amar. Bjo, bjo...

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